domingo, 26 de setembro de 2010

Caruska – A Empresária sem Teto

 Tomas as nuvens por teu carro e voas nas asas do vento.
(Salmo 104:3)

Duas jovens, acabaram de chegar do Japão, onde se pós-graduaram em TV Digital. Presentemente, entretinham-se, rascunhando um projeto de inovação em conteúdo para HDTV – High Definition Television, televisão de alta definição. Os convites para seus casamentos estavam prontos e a vida lhes era por demais favorável. Completariam a felicidade se pudessem conhecer o pai e era por isso que continuavam lutando.

Caruska, sócia absoluta dela mesma, de um bom restaurante, folgava em ver seus negócios espelharem o próprio sucesso. Residia em um apartamento confortável, mas ainda incompatível com seu gosto. Por isso não estava satisfeita. Tanto é, que meses atrás, pagou à vista, um imóvel em Ipanema.

Nos idos dos anos 90, Caruska, órfã de pai e mãe, trabalhando como cozinheira em uma residência no Rio de Janeiro, nem se dava conta do rumo que sua vida tomaria, após haver consentido nos afagos do filho único da família. Conivente com as carícias que o jovem dispensava à serviçal, a madame demonstrava gostar de Caruska.

Quando certa manhã, Caruska, apresentando sintomas de enjôo, foi submetida a um exame e diagnosticada sua prenhez, a situação mudou. Falando com blandícia (meiguice), sua patroa, ofertou-lhe uma pequena importância em caráter indenizatório (cala-boca), catapultando (arremessando para longe) de seu convívio, a linda, inteligente, alegre e vibrante, Caruska.

A atitude da patroa, fez efeito contrário em Caruska. A gravidez, lhe trouxera pela primeira vez na vida a sensação de família. Não poderia permitir que o vulcão de inoportunas lembranças, desmontasse o já "fragilizado" sentido de sua vida. A concepção de um ser, legitimava a tão desejada família e sua força não tardaria em derreter o sofrimento. A saudade dos indizíveis momentos partilhados com o belo jovem, era obra para o próprio tempo se ocupar com a providencial diluição.

Muito animada e confiante, pela certeza de ter conseguido uma família, partiu para o morro, onde tentaria vegetar, até que a poeira assentasse. A preço bem “modiquinho”, alugou um casebre inacabado, faltando as telhas do quarto.

Somando a merreca da "indenizaçãozinha" recebida de sua patroa, à “cara de pau” e a coragem, decidiu se lançar no comércio de “ponta a cabeça”, comprando uma minúscula birosca. Vislumbrava crescer no mercado, e, para isso, aplicou suas habilidades culinárias, cozinhando e negociando comida a peso. O minúsculo empreendimento, representou o primeiro, dos muitos degraus, que com toda a força e luta alavancou a brilhante carreira de empresária, que jamais deixou de nutrir a certeza de poder transformar suor em grana.

Somente quando suas gêmeas fizeram seis meses, conseguiu juntar dinheiro e então telhar o dormitório da ainda incompleta casa. Antes disso, seu teto era o céu, que abrigava lua, estrelas e nuvens. Naquele lugar, dobrava seus joelhos e pedia ajuda a Jesus e este jamais lha negou.

Durante o tempo sem telhado, contemplava as nuvens e estas, por vezes, pareciam estar sendo conduzidas por um Formidável e Poderoso Piloto. Tinha a impressão que o Piloto descia das nuvens para visitá-la, consolar, alegrar e fortalecer. “Tomas as nuvens por teu carro e voas nas asas do vento. (Salmo 104:3)”

Tendo comprado uma cobertura em Ipanema, ainda na planta, Caruska impôs como exigência, a construção de uma estrutura que tornasse o teto da suíte de casal móvel. Próximo à cama, seria instalado um painel informando o status do tempo. Um botão abriria o teto e o outro acionaria o fechamento. Um sensor se encarregaria de voltar a esconder o céu, caso houvesse queda brusca de temperatura ou começasse a chover. Essa parafernália, visava tão somente, apreciar sem reservas: céu, lua,  estrelas e nuvens, em plena cama.

-- Okasan (mamãe em japonês). Você ta muito elegante e bonita para quem apenas veio trabalhar no restaurante. Essa roupinha Armani, é apenas para visitar a nova residência, ou para ser pedida hoje mesmo em casamento? – brincou Carla, enquanto passava a ligação.

-- Tomara que o esposo seja o papai – gracejou seriamente a outra filha, Veruska.

Ansiosas por conhecer o novo ninho de Caruska, as filhas a puseram no carro e, “pé na tábua”. Logo chegaram.

-- Dona Caruska, eu sou o engenheiro responsável por este edifício. O prédio está pronto, faltando somente testar a estrutura especial do seu apartamento.

Quando acionou o dispositivo para abrir o teto, o céu antes alteroso (altão), generosamente renunciando à sua imensurável lonjura, abaixou-se, permitindo-se contemplar muito de perto. O dia tava meio quentinho e repetia-se o efeito narrado há quatro séculos, por Bill Shakes (William Shakespeare), quando disse em seu XVIII Soneto: “o calor daquele verão teria feito o olho do céu brilhar”. Sua luminescência parecia "tomografar" integralmente a alma de Caruska.

A voz desse engenheiro era inconfundível e abalava a alma de Caruska. Lembrou dos tempos da favela. Algo que nunca aparentava incomodá-la, agora a perturbara grandemente, tirando do chão seus pés. Todas as emoções bravamente armazenadas e contidas, agora eclodiam. Uma imensa debilidade alcançava-a e irrompeu em um incontrolável choro. Como pôde viver todos esses anos sem a presença de Alexandre em sua vida.

Esquecendo e ignorando a presença das filhas e do engenheiro, olhou outra vez para uma alvíssima nuvem, que navegava naquele céu fantástico e clamou:

-- Jesus Glorioso, perdoe-me. Tenho um desejo que se o Senhor não atender, terei que continuar estampando em meu rosto, a mais falsa das alegrias. Meu Grandíssimo Deus,  caso Alexandre, ainda esteja disponível, traga-o de volta pra mim. – gritou desesperadamente Caruska.

Súbito, daquela nuvem, desceu imensa sensação de consolo. Os pés voltaram a se firmar no chão. Sentindo a mesma paz da época do barraco, parou de chorar.

O engenheiro disse:

-- Eu e meus pais estamos desde aquele dia, tentando desesperadamente localizá-la. Todos de casa sofremos até hoje, com a sua falta. Mamãe, nunca mais teve um dia alegre, desde que por um gravíssimo erro, admitido por ela própria, lhe despediu. Eu nunca tive ninguém. Canalizei meus sentimentos de amor em estudo e tornei-me dono de uma construtora de médio porte. E acentuou:

-- Sempre estive disponível para você, minha amada. Você perdoa minha mãe?

Silêncio. A nuvem fincava o olho no casal. Incontáveis beijos, venciam as lágrimas e seus rostos fogueados cintilavam, com tanto sentimento. O próprio céu, testemunhava um amor "desapercebidamente" vivido, porém agora mais gratinado e por conseqüência, muito mais saboroso para se curtir.

Caruska, com doce voz, respondeu à desnecessária, -- mas deliciosa de se ouvir --  pergunta do amado:

-- Xandi. Você pode lembrar, quando algum pedido seu, foi negado por Caruska?

As garotas chorando, beijando e abraçando, amassaram a roupa de Alexandre. Trincando qualquer previsibilidade, suas bocas, unidas em um dueto, verbalizavam sentimentos da própria infância, emitindo um único som:

-- Papai.

-- Xandi. Essa tua geringonça, não está funcionando direito, pois foi acionada sem chuva nenhuma. – brincou segura, revigorada e feliz, Caruska.

-- Querida, parece que as lágrimas haviam ativado o sensor que começava a fechar a abóbada. Mas não é nada que eu não consiga resolver. – disse o engenheiro, dessa vez, envaidecendo-se de sua capacidade.

-- Gente. Pouco importa que o sensor seja ativado com chuva, lágrima ou cuspe. Afinal, quem ainda terá motivos para chorar? Alguém dessa família, joga saliva no chão? – e continuou a filha Veruska:

-- Quem ta chorando de fome, é meu estômago. Vamos almoçar? – ensaiando um pouco de comicidade, a jovem, extraía gostosos sorrisos de todos e solucionava o conflito diplomático entre seus pais.

E, como quem fecha uma cortina, a abóbada do dormitório, enquanto encobria o céu, despedia a família, marcando o início à nova fase da história de:

Caruska – A empresária Sem Teto.


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Escrito por:
Gilberto Landim

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